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sábado, 18 de setembro de 2010

Digestão de idéias

“...O Ocidente submeteu cada vez mais o sistema escolar no seu conjunto ao controle do Estado. Do ponto de vista estritamente intelectual, os interessados nada perdiam, pois os professores do ensino oficial possuíam competência... porém esses professores especializados tinham uma concepção restritiva de seu trabalho: o matemático ensina matemáticas, o historiador a história... no final das contas a formação do conjunto é apenas a soma dos ensinos particulares. Ninguém está encarregado de compor os dados particulares fornecidos pelos diversos professores e de constituí-los numa unidade na medida de Homem. O aluno passa de especialista em especialista, esforçando-se para conciliar da melhor maneira possível suas exigências contraditórias. Um tal sistema é desumano porque ninguém, dentre os professores, se preocupa ou tem a seu cargo uma educação da alma. Cada um tenta realizar sua missão segundo sua consciência profissional. Os programas fizeram as respectivas tarefas: pensou-se em tudo, exceto no essencial” (Gusdorf, Georges - “Professores para quê?“).

As bases de uma sociedade capitalista ditaram as regras que imperam na mentalidade dos variados setores, inclusive o educacional. Do período Pós Industrial aos dias de hoje, o advento das tecnologias e o Ensino Tecnicista, prático, repetitivo e metódico resultaram em projetos de lei que incluem crianças de cinco anos de idade no sistema escolar. O conteúdo apostilado recheado por matérias descontextualizadas priorizam a velocidade e a competitividade para o suposto preparo ao temido vestibular. Causa certo estranhamento uma família que opta por um padrão de educação que priorize as artes, a imaginação e o lúdico na construção do conhecimento. O professor então, de formação tradicional e puramente academicista se vê diante de um dilema: o de se enquadrar no modelo imposto e antiquado ou revolucionar sua maneira de pensar e agir, com uma imensa pré-disposição à renovação constante.

Mas, independente da realidade social brasileira, de sermos deficitários em estrutura física e organizacional, a vocação, preparo e amor podem trazer inúmeros benefícios ao aprendizado escolar. A história do professor Mozart Vieira, retratada no filme “Pro dia nascer feliz”, mostra um exemplo de superação e força de vontade. A dedicação com que esse musicista, do interior da Bahia, tratou de ensinar música erudita na terra do baião de Luiz Gonzaga nos faz parar para pensar do quê depende uma boa atuação de um docente hoje em dia no Brasil.

Desse sonhador nasceu um trabalho de resgate cultural através da arte nunca antes imaginado naquela região. Bach e Chopin se fundiram ao forró, frevo, maracatu..., toda a história retratada desde o período barroco, clássico, romântico até o regionalismo e a música brasileira com tantas vertentes trouxe àquelas crianças e jovens uma formação intelectual e crítica, através da educação musical. Apesar das precárias condições de espaço físico para trabalhar – as aulas começaram numa granja- esse educador provou que o material humano e a preocupação social eram o bem mais precioso que poderia ser notado naquela seca do agreste.

Quando os alunos tiraram música da flauta doce, que no começo parecia de brinquedo, Mozart viu que tinha lhes tocado a alma, e da emoção descobriu que dali em diante aqueles meninos tocariam qualquer instrumento. Estava iniciado o primeiro passo para a construção da verdadeira cidadania. Através da percepção de ser parte integrante de uma orquestra nasceu a força e sinal de que aqueles meninos iriam longe... Essa constatação foi comprovada por Saltini (1997) ao afirmar que “as escolas deveriam entender mais de seres humanos e de amor do que de conteúdos e técnicas educativas”. Para ele as escolas têm contribuído em demasia para a construção de “neuróticos por não entenderem de amor, de sonhos, de fantasias, de símbolos e de dores”.

Os pais dos pequenos nordestinos da zona rural, sem nenhuma formação acadêmica e em precárias condições de sobrevivência não entendem a importância de se ouvir uma vocação através da dedicação ao estudo das artes. A rivalidade surge já dentro de casa, quando o impulso deveria nascer: começa aqui o cerceamento do ser humano amputado de suas predestinações e dono de seu próprio destino. E aqui, no gérmen do indivíduo crítico é justificado o analfabetismo fabricado pelas universidades brasileiras, quando estes chegam lá. Quando não, também são justificadas todas as violações aos direitos de crianças e adolescentes, com o alto índice de delitos, evasão escolar, trabalho infantil, prostituição e drogadição. 

Ou seja, há um problema social alarmante em nosso país e todo esse caos surge também pela falta de princípios tanto de pais despreparados quanto de professores no cumprimento de seus papéis. O desamparo de ambos os lados, a desestrutura familiar e desigualdade social mostram-nos esse quadro todos os dias.

Uma das tarefas da Pedagogia Waldorf, fundada por Rudolf Steiner em meados do século XX é a de se formar seres humanos livres, que sejam capazes de, por si mesmos, encontrarem propósito e direção para suas vidas. As propostas pedagógicas de Steiner foram absolutamente revolucionárias e originais, desde separar os alunos em classes mistas até o fato de não haver notas ou repetições de ano, passando pela figura do Professor de Classe, que acompanha uma dada turma da 1ª à 8ª série, e ainda o ensino em "épocas", períodos em que apenas uma matéria é ministrada durante três ou quatro semanas, diariamente.  Mas, a meu ver a originalidade mais marcante da Pedagogia Waldorf é o fato de todo o ensino ser baseado em uma visão holística do desenvolvimento do homem, como um ser volitivo, emotivo e intelectual. Tal visão espiritualista conceitua claramente o que vem a ser o corpo, a alma e o espírito humanos e além do desenvolvimento físico, há a progressiva manifestação dos variados avanços no decorrer de nossas vidas, em períodos bem marcados.


Em sua “A Filosofia da Liberdade”, Steiner escreveu: "A natureza faz do ser humano um mero ser natural; a sociedade, um ser que age conforme leis; um ser livre, somente ele pode fazer de si mesmo. A natureza libera o ser humano em determinado estado de sua evolução; a sociedade o conduz alguns passos adiante; o último aperfeiçoamento somente ele pode dar a si mesmo." (p. 119, ênfases do autor). A escola Waldorf tem como meta justamente preparar os alunos para viverem plenamente em sociedade, e prepará-los para continuar seus estudos e darem os passos do autodesenvolvimento no caminho para a liberdade.

Não é fácil criar a potencialidade para a liberdade no mudo atual, onde a massificação, os meios eletrônicos e a ação movida por prazeres superficiais e muitas vezes artificiais, estão cada vez mais impedindo o ser humano de atuar livremente. Mas cabe a cada um de nós contribuirmos com nossa energia e amor para que consigamos cuidar melhor de nossas crianças e de sua educação. 

domingo, 20 de junho de 2010

Memorial de formação

“Para desenvolver o gosto nas crianças, é preciso que entrem em uma escola especial onde possam fazer aquilo que se faz com a química nos laboratórios. Elas devem ter máscaras, roupas o objetos para brincar. Elas devem ter móveis para decorar quartos no cenário. Os móveis devem ser de boa e má qualidade, as roupas de diferentes qualidades. Elas precisam ter blocos de construção com peças de épocas diferentes, entre as quais possam escolher. A partir de pequenos moldes devem aprender a planejar jardins e fazer arranjos com flores artificiais. Para a aula de música elas necessitam de gravadores, com fitas de trechos de obras musicais. Elas devem aprender a fotografar e a fazer composições, a moldar e a pintar potes de barro. Elas necessitam de tipografias para compor páginas de livros. De pastas com imagens Kitsch. Precisam ler poemas, e ouvir bons e maus oradores, em discos. Precisam de caixas com objetos de uso nobre, talheres, cartas de baralho.“ (Brecht, Bertolt - “Escola de Estética“).

Imaginem essa escola especial hoje em dia funcionando em nossa sociedade. Do período Pós Industrial aos dias de hoje, com o advento das tecnologias e o Ensino Tecnicista, prático, repetitivo e metódico, uma família que opta por um padrão de educação que não se encaixe aos “moldes do mercado”, como ouço por aí, seria no mínimo criticada e vista com maus olhos. “Perda de tempo, esse brincar”... Fui uma criança criada nos moldes esperados pela sociedade, porém fui criada com toda a liberdade de inventar, desenhar... Felizmente eu pude aproveitar desse brincar livre tão essencial nesse período da vida.

Vim de uma família de pai médico e mãe dona de boutique de roupas, que revezava seus afazeres com o dever de casa, a paixão pelo piano, livros, pintura... Eu me via nos anos oitenta entre discos de vinis de Rita Lee, The Who, Beatles e Elis... Os meus eram do Pluct Plact Zum!, Balão Mágico, Menudo e Turma da Mônica. Na prateleira de revistas, as adultas como a Revista Mad e Chiclete com Banana conviviam muito bem com meus gibizinhos e revistas infantis, para depois se harmonizarem com minhas Capricho, na adolescência. Nessa época, os programas prediletos de TV eram além da Turma da Xuxa, os episódios do Sítio do Pica-pau Amarelo, do Viva o Gordo e do humorístico de Chico Anísio.

O jardim de infância teve sua importância em minha memória, inclusive cívica, onde as fotos dos desfiles de 7 de setembro me remetem a um sentimento bom, patriótico, interessante, apesar da pouca idade que eu tinha. Era a Cirandinha, onde eu ainda podia exercer atividades, não apostiladas, como a pintura, a colagem, a massinha de modelar. Esse modelo do brincar pode ter seus dias contados, por sugestão do Senador Flávio Arns (o Senador pretende aprovar um projeto de lei obrigando o ingresso da criança com 5 anos no Ensino Fundamental, um verdadeiro atentado contra a infância!...).

Nos meus cinco anos de idade, nos mudamos para Liverpool, Inglaterra, por opção profissional do meu pai, que, antes da recessão que assolaria o país, resolveu se desfazer de tudo e recomeçar uma nova vida na terra da rainha, como num sopro de aventura e esperança. Tudo isso em 1982. Convivi em uma escola nos tradicionais moldes ingleses, de saia pregueada e gravata. O presente predileto da professora eram nossas bolas de neve, que ela guardava com cuidado na estante da sala de aula, sem derreter...

Voltamos, recomeçamos novamente aqui no Brasil e com um currículo turbinado pela Oxford, assisti à minha família passar os últimos anos do Regime Militar.  Em 15 de janeiro de 1985, Tancredo Neves vence as eleições para presidente da República do Brasil no Colégio Eleitoral, encerrando a ditadura militar no país. Entretanto, Tancredo morre e quem assume o cargo é José Sarney, seu vice. Lembro-me da cena do nosso povo aos prantos, inconformado com essa surpresa do destino. Estava na sala de casa e meus pais, boquiabertos, tentavam em vão explicar toda a situação à uma criança de apenas oito anos.

Mas o tempo ainda era de vacas gordas e logo em seguida demos uma guinada novamente. Era tão simples encher o tanque do carro, viajar de férias e passar um mês na praia, de pernas para o ar... Ganhar pencas de presente no Natal, que tinha mesas muito fartas e três empregadas: uma para a casa, uma para cozinha e uma babá.

Éramos duas irmãs, eu a primogênita, e em 1983 nasceu meu irmão, e a família cresceu um pouquinho mais. Da escola, o antigo Colégio Santo Antônio, tenho muitas lembranças, sempre boas e acolhedoras. Hoje, no mesmo prédio, o imenso e tradicionalíssimo colégio de freiras já não está tão gigante como parecia na época. Lá estuda minha filha de 11 anos e apesar do Sistema Objetivo de ensino ter acabado com o saudoso mimeógrafo, alguns professores continuam os mesmos da minha época. O afeto que tinham por mim foi automaticamente transferido para a minha filha, como fez a Tia Soninha e a Tiririca ao a adotarem com uma relação afetiva e verdadeira.

Mas o clima familiar e a escola como a extensão da minha casa hoje já não existe mais e a frieza para o preparo no ingresso da faculdade através do temido vestibular fez com que essa relação entre docentes e alunos desse uma bela esfriada. Entrei no Pré-primário da Tia Vânia com 6 anos e conclui o Ensino Fundamental aos 14 anos, a antiga oitava série, em 1991. O diretor na época era o famoso Sr. Hélio Mano, que fazia a meninada “tremer na base” com a sua famosa voz estrondosa, grave, firme e autoritária. Ficávamos em fila, todos no pátio, e um após o outro andávamos até a sala de aula, sem um pio. Das matérias que cursávamos apenas a de “Estudos Sociais” saiu do currículo. Cantávamos o hino uma vez por semana com o hasteamento da bandeira nacional e era dado um valor ao patriotismo que hoje anda tão esquecido. Em contrapartida a matéria que atualmente mais se aproxima desse papel de conscientização quanto às questões morais e sociais é a Filosofia, que minha filha adora. Em sala de aula, o professor brinca, cria jogos interativos, incentiva a colaboração e sai um pouco do padrão formatado pela escola. É a aula mais esperada da semana, onde eles sentem que “tudo pode” e os muros da escola parecem menos rígidos e concretos.  

Cursei o Ensino Médio de 1991 a 1993. Uma passagem marcante nessa fase foi minha participação com a escola do Desfile do dia da Independência de “cara pintada”, em 1992. O impeachment do Presidente Collor foi o primeiro ato político importante que presenciei. Em 93, a escolha do Plebiscito para Presidencialismo, Parlamentarismo e Monarquia também teve destaque em minha formação.

Passei no vestibular para Propaganda e Marketing durante o governo Itamar Franco. Mudei-me para São Paulo, onde cursei a ESPM e em 1994 conheci a Internet e o Plano Real. A inflação galopante teve seus dias contados após o plano, e a abertura econômica e o ajuste neolieral de FHC vindos da proposta de privatização seguraram o país de uma queda ainda mais brusca. As gôndolas dos supermercados agora dispunham de produtos importados, antes somente vistos no Paraguai, quando criança, em viagem com meus avós.

Com base no conceito de equidade social nos estudos produzidos pelos Organismos Internacionais ligados à ONU, o então presidente Fernando Henrique Cardoso, (1995-1998) através de uma política educacional do modelo de Estado Capitalista, defendeu a idéia de que a tarefa de assegurar a educação era de todos os setores da sociedade. Concordo plenamente, mas a sociedade não se engajou nessa tarefa e o Estado caminhou no sentido de redução no cumprimento de suas obrigações. A Educação Nacional caminha para a divisão de responsabilidades entre o Estado e a sociedade. A descentralização promoveu a municipalização da educação primária como forma de tirar a responsabilidade estatal com esse nível de ensino.

Dessa época, o eixo descentralizado e racionalizado articulou a municipalização do ensino e a criação do FUNDEF - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental. Aos municípios foi repassada a responsabilidade com esse nível de ensino e pelo que tenho visto a Municipalidade ainda engatinha para um modelo ideal. Professores e monitores mal preparados não dão conta do número crescente de crianças, nascidas e desamparadas por uma sociedade que também não reconhece a importância da educação sexual de adolescentes e do planejamento familiar como medida de saúde básica.

Não teve saída: a crise veio e a recessão trouxe também o fim do desenvolvimento autônomo do Brasil, que se viu preso às decisões políticas do FMI e Banco Mundial. Formei-me em 1998, casei e tive a minha filha e tinha desespero em voltar a trabalhar na área, já que tinha voltado para a cidade dos meus pais e me via isolada, fora do eixo e o desemprego me assombrava. Já nos primeiros meses de vida da minha bebê fomos eu e seu pai trabalhar em São Paulo, novamente, mas a distância pesou mais do que a ansiedade da idade em me tornar independente.

Passaram-se dois anos e uma boa proposta de um site na área me fez mudar com babá e tudo de novo para a capital. A Internet foi fundamental nessa fase dela com 2 anos, pois trabalhava tempo no escritório, tempo nas Coletivas de Imprensa e consequentemente um tempo em casa,  atualizando os conteúdos on-line. Mudamos-nos para o Guarujá, num apartamento da família, onde atualizava as notícias da sala, com vista para o mar. Nessa época conheci a Pedagogia Waldorf através de uma amiga que viria a tornar-me sócia numa confecção de roupas um ano mais tarde, ao me desligar do AdVertica. No Jardim de Infância Alternativa tive a escola ideal, a meu ver, para o primeiro setênio da Júlia.

Viramos o século e 2001 foi marcante pela virada e pela “Crise do Apagão”.  Em 2002 fomos explorar a Europa, numa viagem onde vendemos muito, nos divertimos idem e vimos o Brasil Penta Campeão da COPA do Mundo de Futebol! Foi uma ótima fase, mas como todas, passou e meu desligamento da empresa se deu junto à separação de minha sócia, o que contribuiu para o desfecho da sociedade.

Em 2003 Lulla foi eleito Presidente e uma nova chance me aguardava em Ourinhos. A campanha do atual Prefeito da cidade me trouxe de voltas à terrinha. Fiz parte da equipe de marketing que deu a esmagadora vitória ao Prefeito e mais uma conquista profissional. Mas apesar de tudo, propaganda não era a “minha” alma do negócio. Nessa época comecei a cursar Pedagogia semi-presencial, onde reencontrei nossa atual Secretária de Cultura, na época minha ex professora de piano, no mesmo curso que eu. As águas passadas contribuíram para a então empossada Secretária me escolhesse como Diretora do Teatro Municipal Miguel Cury e me sugerisse ao cargo. Aliado ao sucesso da campanha e das boas relações que mantive na época, entrei para a atual equipe dos cargos de confiança.
Dois anos se passaram. O Prefeito foi reeleito em 2008 e com toda a mudança política, fui trocada de cargo, o que na época me deprimiu devido ao apego e aprendizado que tive na época. Enfim, a surpresa só me trouxe conquistas, descobertas e realizações profissionais. Por ironia do destino o que de começo me assombrou, hoje é a “menina dos olhos” meus. Fui nomeada para cuidar de um espaço da Prefeitura Municipal chamado Casinha da Esquina. A casa de gibis, revistas e jornais para troca e leitura, além de abrigar exposições e oficinas culturais, faz parte do Centro de Convivência, onde se encontra o Museu Pedagógico e Histórico de Ourinhos e o Espaço do Professor, atrelados à cultura e educação.
Participo ativamente agendando visitas de escolas e instituições como a APAE (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais), os CRAS (Centro de Referência de Assistência Social), o CAPS (Centro de Apoio Psicosocial), lar de meninos e abrigos infantis. Lá eu desenvolvo um trabalho com as crianças de contação de histórias, teatro de sombra, exibição de filmes curtas-metragens ou de alguma atividade artesanal, como o papel reciclado ou a oficina de Pin Hole (foto na lata).
Este ano a Secretaria de Cultura organizou ações em comemoração aos 90 anos de nascimento de Clarice Linspector, da qual estou tendo contato com a obra e me tornando sua fiel admiradora! Além de público espontâneo e de escolas e instituições, abrigamos a Oficina de Leitura “Para Ler o Mundo”, com a terceira idade, uma verdadeira escola para mim. A chance dessas senhoras de retomar sua cidadania, poderem fazer uma compra de mercado, pegar um ônibus com segurança, enfim, essa autonomia de realizarem coisas que parecem tão simples, mas que sem a leitura se tornam praticamente impossíveis, é um trabalho primoroso e muito importante.
Com todo esse universo de aprendizagem ao meu redor, retomei o contato com a Pedagogia Waldorf, e estou também estudando Antroposofia no Curso Livre em Fundamentação da Pedagogia Waldorf, em Jaguariúna, uma vez ao mês em regime de imersão, no Sítio das Fontes.  Acredito muito que todo o lado artístico, lúdico e puro que minha filha conserva ainda aos 11 anos tem raízes fortes de sua primeira infância no jardim Waldorf que a abrigou de maneira consciente e comprometida. Volto toda vez do meu curso inconformada com o conteúdo imposto que minha filha é obrigada a engolir todos os dias numa escola onde a matéria de ensino se restringe ao conhecimento mensurável da ciência objetiva. E sei que o ser humano é muito mais complexo do que isso, muito mais individual e especial do que somente um número na lista de chamadas do professor.

Hoje estou muito mais madura e preocupada com questões sociais e desigualdades que assolam o nosso país. Tivemos, sim, com o Presidente Lulla um aumento real no poder de compra do cidadão comum, mas apesar do “Bolsa Família”, do “Minha Casa, Minha Vida” e do “IPI zero”, não tivemos uma real melhora em nossa Educação nem uma política efetiva que tratasse nosso professorado com mais dignidade e preparo. Estamos somente aumentando nossa poluição sonora, física e mental.
Procurei a Pedagogia por aptidão, por vontade de “consertar” e conservar a educação da minha filha e pela vocação a qual me dedico de corpo e alma. Creio na formação continuada do educador no sentido reflexivo de sua própria arte no Ensino. Também credito a maturidade trazida no dia-a-dia em sala de aula se, e somente se, esse professor trabalhar em reflexão, com autodidatismo, sensibilidade e comprometimento.

Creio fazer um trabalho onde aprendo mais a cada dia, onde posso colaborar efetivamente na formação de brasileirinhos muitas vezes tão desamparados e órfãos. Órfãos de pai, mãe, ou educação, auto-estima, civilidade, amor... 


segunda-feira, 3 de maio de 2010

Clarice Linspector

Aproveito o espaço para postar um pouco de Clarice...

" Sou uma filha da natureza:
quero pegar, sentir, tocar, ser.
E tudo isso já faz parte de um todo,
de um mistério.
Sou uma só... Sou um ser.
E deixo que você seja. Isso lhe assusta?
Creio que sim. Mas vale a pena.
Mesmo que doa. Dói só no começo."


Clarice Lispector



Sobre cultura, flores, terra e abelhas

Cultura vem do verbo “cólere” e exprime a idéia de amanhar, cuidar e revolver a terra, para semear boa semente e produzir mais e melhor. Parênteses 1: como pensar no desenvolvimento e educação de um povo sem a inclusão cultural do mesmo? Uma criança sem a chance de ser cuidada, semeada, terá força para germinar? Quais condições são propícias para essa sementinha crescer sadia?

Ao longo da história da humanidade, a palavra cultura foi ganhando outros significados. Na Idade Média, a França referia-se à cultura como o culto religioso, uma vez que a visão de mundo era centrada numa perspectiva teocêntrica e a Igreja Católica detinha o poder.

Já no século XVIII, a Ciência Moderna traz a ampliação do termo para “Cultura das Letras” ou “Cultura das Ciências”, expressando o progresso individual do ser, estando assim diretamente vincula à educação do indivíduo. Parênteses 2: A semente foi plantada na terra e agora, será que vai chover? Essa terra está afofada, úmida, o ambiente está propício para fincarem suas raízes e o caule crescer, cada vez mais, para cima?

O termo é traduzido no século XIX por historiadores alemães. Kultur (alemão) é entendido como sendo o progresso intelectual e social da humanidade, representando movimento, aperfeiçoamento e evolução do espírito. Assim, a cultura compreende os costumes, as instituições, as idéias, as artes e as ciências.

Mais tarde, sobretudo em Cícero, o verbo “cólere” vinha sempre acompanhado do termo “animus”: cultura animi. O homem que cultiva a natureza, cultiva também a sua própria natureza. Era, assim, sinônimo de educação, no sentido de aprimoramento do espírito.Parênteses 3: O homem culto tem a partir de então a chance de cultivar o melhor de si e também a de aprimorar seu espírito. Uma semente germina sem adubo? Sem o sol? Depois de germinada, ela nasce, cresce, e depois morre? Outras plantas virão dessa semente? O que é a morte? Qual o papel do pólen na natureza?

Já os gregos, mais afeitos à vida social e política, em lugar do conceito de “cultura animi” possuíam o de “politéia”, adquirida através da “paidéia”, isto é, educação da polidez e da nobreza para a vida social da polis. A este conceito, os romanos denominaram, mais tarde, de “civilitas”, civilidade, donde se originou “civilização”, educação. Aqui, o homem começa se expressar socialmente, e a cultura integra e traz a noção de identidade. Parênteses 4: O pólen se espalha sozinho? E as abelhas, qual sua importância nessa cadeia? Elas trabalham sozinhas ou em conjunto? Mas então são seres muito evoluídos as abelhas, não? A natureza realmente é perfeita... então com o que se preocupar, não é mesmo?

Cultura significa ainda os próprios resultados da ação do homem sobre a natureza, Neste sentido, ela é “fruto da terra e do trabalho do homem”. Desde logo, distinguem-se os produtos naturais e os produtos culturais. Os produtos naturais são os que brotam livremente da terra ou da natureza. Os produtos culturais, ao contrário, resultam da ação da natureza, mais a ação do homem, isto é, os que o campo gera quando o homem o lavra e o semeia. Parênteses 5: Qual é a função do agricultor, do homem da terra? E do educador? Cabe aqui compará-las?

Cultura, assim como polidez ou civilidade, aparece como a ação do homem, individual ou coletivo, sobre a natureza, terra, deuses, amigos ou o próprio homem, no sentido de dispensar-lhes especiais cuidados, a fim de que produzam mais e melhor, ou sejam propícios e colaboradores. Parênteses 6: Existe povo sem cultura? Existe cultura sem identidade? Não seriam em alguma instância sinônimos?

Ainda filosofando e brincando com a metáfora, notei que foram os sofistas gregos que contrapuseram, pela primeira vez, a idéia de natureza e a de cultura. Desde então, essa antítese não mais foi esquecida.Desde que o homem se dá conta de si, dá-se também conta de que está no mundo. É a dualidade entre o mundo subjetiva e o mundo objetivo. É a oposição fundamental, que lhe causa curiosidade e espanto, fontes de sabedoria e de atividade. Parênteses 7: a abelha sai do seu habitat, busca o pólen e produz o mel. Ela viaja entre as flores, absorve seu perfume, bebe da fonte e transforma-a em um doce e delicioso alimento.

Assim é a cultura. Vinda do povo, para o povo, dessa troca. Das flores para a produção do mel, do conhecimento. Do trabalho em aguar a semente, de expô-la ao sol, de arar a terra, de adubá-la com conteúdos diversos e abundantes. Do cultivo do que nos alimentará...Dá trabalho, mas no fim vale à pena, vale muito à pena...

Livros, livros, histórias e mais histórias



Buon diorno! Esse ano começa uma nova história na cultura de Ourinhos. Será o Ano da Leitura em Ourinhos, comemorado com diversas ações pela Secretaria Municipal de Cultura. Clarice Linspector é a homenageada este ano, quando completaria 90 anos. Quinta passada teve início o Ano da Leitura e foi inaugurado o Ponto de Cultura- projeto da Biblioteca Municipal Tristão de Athayde, aprovado pelo Ministério da Cultura e Governo do Estado, realizado em parceria com a Secretaria Municipal de Cultura. A Biblioteca teve seu espaço físico inteiramente revitalizado.

No evento, livros espalhados, pufs, almofadas convidavam à leitura, num ambiente acolhedor, claro, organizado.

Muitos títulos para todos os gostos, davam água na boca... No andar de cima foram criadas as instalações do Ponto de Cultura, com laboratório de áudio visual que abrigará oficinas de foto, vídeo, radiojornalismo... teatro. A criançada fez a encenação de um velório e a viuvinha chorou de verdade... descompassadamente.

A minha história continua por aqui... gravamos com a minha voz o slogan e as chamadas de rádio, o que me encheu de orgulho por disseminar a importância da literatura num meio de comunicação tão popular quanto o rádio. Novos livros chegaram e estão chegando à Casinha. Estou empenhada e feliz por poder disseminar esse hábito tão importante da leitura.

Foi com satisfação que aceitei o desafio de contar história para as crianças dos CRAS, como parte da programação do Ano da Leitura em Ourinhos. Tenho uma enorme responsabilidade e algumasquestões que vêm e vão, como a escolha dos temas. Contaria uma história didática? Com sentido moral, ético, com mensagem de paz, amor? Ou algum conto de fantasia, do mundo de as fadas, duendes, seres da floresta... um mundo tão lindo e colorido, que os tirem um pouco da realidade em que vivem?

Estou pensando em contar a história de algumas lendas folclóricas brasileiras, como a do Saci Pererê, do Curupira, da Iara, do Lobisomem... pode ser ao mesmo tempo divertido e didático... e eu estaria também reforçando a divulgação da nossa cultura popular para essa criançada que já não liga muito para as cantigas de roda, as brincadeiras de peão e todo o universo que cerca essa sabedoria popular.

Com toda essa inspiração sobrevoando a minha mente, fui atrás de alimentar uma curiosidade que estava me encasquetando: a etimologia da palavra CULTURA. Mas isso é tema de uma outra história, que não pára por aí...

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Vacas no céu do interior

É... o Ano da Leitura em Ourinhos tem feito jus ao nome! Diversas ações estão sendo criadas (no tempo presente e sem gerundismo) afim de difundir e estimular o hábito da leitura entre as pessoas.  


A Casinha da Esquina por ser um espaço destinado ao cultivo desse bom e velho hábito, entrou na dança em mais um evento, que prestigia o lançamento de "Vacas no céu do interior", do poeta ourinhense Ari Marinho Bueno. 


O livro traz poesias de quando Ari ainda morava na cidade ao lado de criações mais recentes, o que revela a habilidade do autor com as palavras. "Travei conhecimento com muitos poetas e fui tentando colocar nas coisas que escrevi não só a influência advinda dessas leituras, principalmente com relação à estética – e que foram muitas, mas também propor um trabalho que tivesse algum engajamento", revela Ari.


Enquanto morava em Ourinhos, Ari sempre esteve ligado ao movimento em torno da literatura, além de ter sido o primeiro presidente da Associação de Amigos da Biblioteca Pública, a AABiP, entidade que ajudou a fundar. O livro será lançado também na Bienal Internacional do Livro de São Paulo, que acontece entre os dias 12 e 22 de agosto. 


O lançamento de "Vacas no céu do interior" será lá na Casinha. Dia 24 de abril, sábado, às 21h00. Apareçam!




CAPS sempre presente na Casinha


Dando continuidade à nossa sessão de encontros, Azlin levou hoje mais uma vez os usuários do CAPS até a Casinha. Olhos atentos. Perguntas em tom inseguro foram dando lugar à curiosidade e logo a Turma da Mônica, Ziraldo, Rubem Alves passavam de mão em mão.

Semana passada, além do estímulo à leitura, propus a eles a brincadeira de Adivinhação.No começo, sorrisinhos amarelos, caras tímidas, caras pálidas. Depois o tom de diversão e superação foi tomando conta do ambiente.

Primeiro distribuí os 'O que é o que é?' para cada um. Em seguida, começamos a ler em voz alta, o que os deixou mais à vontade. As respostas ficavam em cima da mesa, e como crianças grandes alguns queriam "colar" o resultado. Mas, toda a ambientação e clima propícios fizeram a "brincadeira" (entre aspas mesmo) tomar um outro rumo. A socialização começou a tomar corpo nesses corpos muitas vezes esquecidos.

Os que ainda andavam receosos, aos poucos foram se soltando até que todo mundo se colocou ante sua dificuldade com menos medo, mais confiança, mais leveza.

Além da leitura, a imaginação, a dicção e expressão também foram trabalhadas.

Tati participou fazendo lindas fotos e uma matéria nota 10, o que rendeu a Capa do Jornal da Divisa de anteontem.


O que me deixou muito feliz!

Mais feliz ainda quando sem nenhuma pretensão, aqueles sorrisos guardados superavam mais um obstáculo. Matavam mais um dos leões do dia...